Mulher – meu lugar de fala
Mulher,
Eu tendo a evitar de falar de assuntos muito em voga aqui, não por não gostar da discussão, amo, mas é porque sempre penso que outras pessoas que escrevem bem melhor que eu já se deram ao trabalho, então, vai parecer apenas chuva no molhado e mais do mesmo, só que menos.
Acontece que eu sou mulher, acontece que hoje eu li a entrevista da Michella Marys n´O Globo, acontece que eu li esse texto da Caol Burgo e acontece que hoje eu deixei de ir a um evento no centro do Rio pelo simples fato de eu ser mulher e eu ter medo.
Já fui dessas mulheres imbecis que achavam que feminismo era coisa de mulher mal amada. Sim, eu assumo minha ignorância sem medo, vivo em fase de aprendizado, ainda bem. Era daquelas que até me sentia envaidecida com um fiu-fiu, apesar de gelar de medo e apressar o passo. Já ri de piada de “loura-burra”, já julguei mulher pela roupa, já julguei mães pela má educação dos filhos, eu já fui uma mulher pior. Uma pessoa pior. Veja este texto aqui, escrito há um ano, e veja como evoluí rápido (amém!). Nem repare a foto e a diagramação, por favor, era tudo muito pior do que é. Amém!
Não era má, isso eu posso garantir, mas eu era ignorante. No sentido mesmo de não saber, de não conhecer e burra por não pesquisar antes de falar.
Agora que eu já fiz minha mea culpa, deixa eu te dizer.
A matéria da Michella mexeu comigo o dia inteiro. Uma mulher casada com um J U Í Z da corte dos D I R E I T O S H U M A N O S, que brutalmente a estuprava, batia, sem falar do assédio moral e dos danos psicológicos que ele cultivava, por anos, pra mantê-la presa a ele. Ela, uma mulher esclarecida, estudada, branca e rica. E você pensando que isso só acontece com quem é pobre, negro e sem instrução. NÃO. Se você prestar bem atenção, pode estar acontecendo até com você.
Lembro-me do meu primeiro assédio – tinha oito anos de idade. Ainda bem que o agressor não foi às vias de fato, mas me causou um trauma que me prejudicou a infância e acredito que até hoje eu sofra essas consequências. Elas não passam. Digo primeiro, porque já passei por inúmeras situações no trabalho de assédio por caras que se achavam poderosos e, de uma forma ou de outra, te abraçam com um aperto a mais na cintura, uma intimidade não consentida, mas que eu demorei pra entender que, SIM, aquela porra era assédio.
Lembro-me de uma vez que um namorado me pediu, carinhosamente, para eu trocar uma roupa, pois estava decotada. Detalhe, eu estava simplesmente indo fazer uma caminha com a minha mãe e estava com uma regata e top por baixo. A bobinha aqui trocou de roupa, vestiu a camisa dele com manga. Resultado, senti tanto calor que quase passei mal. Mas me serviu de aprendizado: NUNCA MAIS EU DEIXEI NAMORADO ALGUM OPINAR NAS MINHAS ROUPAS. É bem verdade que mais nenhum tentou, porque a gente evolui e acaba encontrando pessoas que tenham mais a ver com a gente. Mesmo assim, vale ficar alerta. Machismo.
Vamos andando. Quantas vezes você fez sexo sem estar a fim, mas por achar que devia isso a seu marido como esposa? O contrário já aconteceu? Duvido, até porque o dito cujo nem sobe quando o homem não quer. Daí você se submete a algo que nem tá com tanta vontade assim, mas bate uma culpa e você tem um alívio quando acaba e ele vira pro lado e dorme. Isso é quase um estupro, baby. E há casos que, de fato, há o estupro, dentro de casa, em cima da cama do casal. Machismo.
As vezes que ele te diminuiu na frente dos outros, ou dentro de casa mesmo, ou aquela grosseira que você vê o marido da sua amiga fazer com ela e não tem coragem de fazer nada. Faça. Fale com ele, fale com ela. FALE.
O cara deixa a responsabilidade de criar os filhos nas tuas costas porque provê o dinheiro pra dentro de casa e você acha que isso é mais do que justo. Não é. Dar o almoço, trocar as fraldas, lavar uma louça, fazer a comida, botar pra dormir, contar histórias, ajudar com as tarefinhas é tarefa de ambos. Você não é funcionária dele, e sim mulher. e nem é dele, é sua e dos seus filhos. Esta com ele só, e unicamente só, porque quer. E se ele faz tudo isso que eu citei, ele não faz mais do que a obrigação. INCENTIVE, OU COBRE!
Contudo, muito mais do que a luta contra o machismo dos homens, nossa luta primeira deve ser contra o machismo em nós mulheres.
É esse olhar torto pro comportamento da Fulana, é esse “a culpa é dela porque tava de roupa curta”, é esse “é bem feito, quem mandou trair o marido” (você não sabe da metade do que ela passa naquele casamento, não julgue, ACOLHA), é essa cobrança pela juventude eterna, a sua e a das outras, é como você cria seus filhas e filhos (principalmente) pro mundo, é você acha que a mulher não tem direito a decidir o que acontece com o próprio corpo e achar que o Estado deve julgar se ela deve ter filho ou não (estou falando do aborto, amigas, que deve ser a decisão mais difícil pra uma mulher tomar, então, SEJA SOLIDÁRIA). MILITE! Mas a favor, não contra às mulheres
Não é pra ter raiva de homem, mas é pra ter sim toda vez que este homem, seja ele quem for – seu pai, irmão, marido, melhor amigo – for desrespeitoso com qualquer mulher que seja. Chame atenção, brigue, NÃO RELEVE!
Seja contra qualquer política de privação dos direitos das mulheres, seja a de cuidar de seus filhos como bem entender (comprovada a sanidade, óbvio), seja pelo corpo da gente. Não vote na bancada evangélica, não apoie seus desmandos absurdos. VOTE CONTRA!
E, por último, não considere feminismo um exagero, ainda que você pense que sim, pois muitas mulheres feministas morreram e estão morrendo ainda, para que você possa desfilar seu brilho por aí sem nem saber o que é machismo. Já foi mais difícil, lembre-se de que os casamentos eram arranjados em qualquer classe social – ele ainda o é em muitos lugares. Lembre-se de que não votávamos, não opinávamos e o nosso prazer era absolutamente irrelevante. Só servíamos para dar prazer aos homens e procriar. LUTE!
Então, queridas, é isso vamos nos dar as mãos, vamos nos abraçar, VAMOS NOS UNIR.